Umanità Nova, n.º 132
7 de junho de 1922
A “greve geral” é, sem nenhuma dúvida, uma arma poderosa nas mãos do proletariado; ela é ou pode ser um modo e a ocasião de desencadear uma revolução social radical.
Entretanto, eu me pergunto se a idéia da greve geral não fez mais mal do que bem à causa da revolução!
Na realidade, creio que no passado o mal levou a melhor sobre o bem, e hoje poderia ser o contrário, ou seja, a greve geral poderia ser um meio eficaz de transformação social, mas sob a condição de compreendê-la e de utilizá-la de uma forma diferente daquela praticada pelos seus antigos partidários.
Nos primeiros momentos do movimento socialista, e em particular na Itália, durante a 1.ª Internacional, quando a lembrança das lutas dos mazzinianos ainda estava bem recente e uma grande parte dos homens que haviam combatido pela “Itália” nas fileiras do exército de Garibaldi ainda vivia, desiludida e indignada pelo massacre que os monarquistas e os capitalistas perpetravam contra a “pátria”, estava perfeitamente claro que o regime defendido pelas baionetas só podia ser derrubado se se convencesse uma parte dos soldados a defender o povo e a derrotar, pela luta armada, as forças da polícia e os soldados que tivessem permanecido fiéis à disciplina.
É por esta razão que se conspirava, quer dizer, que se fazia uma propaganda ativa entre os soldados, procurava armar-se, preparavam-se planos de ação militar.
A bem da verdade, os resultados eram pequenos porque éramos pouco numerosos, porque os objetivos sociais pelos quais se queria fazer a revolução eram desconhecidos e rejeitados pelo conjunto da população; porque, em suma, “os tempos não estavam maduros”.
Mas a vontade de preparar a insurreição existia e ela encontrava pouco a pouco o meio de realizá-la; a propaganda começava a tocar mais pessoas e a dar seus frutos; “os tempos amadureciam”, o que em parte era devido à ação direta dos revolucionários e ainda mais à evolução econômica que, aguçando o conflito entre os trabalhadores e os patrões, desenvolvia a consciência deste conflito, do qual os revolucionários tiravam partido.
As esperanças colocadas na revolução social aumentavam, e parecia certo que através das lutas, das perseguições, das tentativas mais ou menos “inconsideradas” e infelizes, as paradas e as retomadas de atividade febril, chegar-se-ia, em um tempo bastante breve, a desencadear a explosão final e vitoriosa que deveria abater o regime político e econômico em vigor e abrir a via a uma evolução mais livre ruma a novas formas de vida em comum, fundada sobre a liberdade de todos, sobre a justiça para todos, sobre a fraternidade e a solidariedade para todos.
* * *
Mas o marxismo veio frear através de seus dogmas e de seu fatalismo o ímpeto voluntarista da juventude socialista (na época os anarquistas também se chamavam socialistas).
E infelizmente, com suas aparências científicas (estava-se em plena embriaguez cientificista), o marxismo ludibriou, atraiu e desviou a maioria dos anarquistas.
Os marxistas puseram-se a dizer que “a revolução não se faz, ela surge”; diziam que o socialismo viria necessariamente seguindo “o curso natural e fatal das coisas” e que o fator político (a força, a violência posta ao serviço dos interesses econômicos) não tinha nenhuma importância, e o fator econômico determinava a vida social por completo. E, assim, a preparação da insurreição foi deixada de lado e praticamente abandonada.
Eu gostaria de observar que se os marxistas desprezavam toda luta política quando se tratava de uma luta que tendia à insurreição, eles decidiram repentinamente que a política era o principal meio, e quase o único, para fazer triunfar o socialismo, tão logo eles entreviram a possibilidade de entrar para o Parlamento e dar à luta política o sentido restritivo de luta eleitoral. E se aplicaram, assim, a apagar nas massas todo entusiasmo pela ação insurrecional.
Foi então que, diante deste estado de coisas e deste estado de espírito geral que a idéia da greve geral foi lançada e acolhida com entusiasmo por aqueles que não tinham confiança na ação parlamentar e que viam na greve geral uma via nova e promissora que se abria à ação popular.
Todavia, por infelicidade, a maioria não via na greve geral um meio para levar as massas à insurreição, isto é, a abater o poder político pela violência e a tomar posse da terra, dos meios de produção de toda a riqueza social. Para eles, a greve geral substituía a insurreição; viam nela um meio para “tornar faminta a burguesia” e faze-la capitular sem combater.
E como é fatal que o cômico e o grotesco estejam sempre juntos, até mesmo nas coisas mais sérias, houve quem empreendesse a busca de ervas e de “pílulas” capazes de sustentar indefinidamente o corpo humano sem que seja necessário alimentar-se; e isso, a fim de assinalá-las aos trabalhadores e coloca-los em condições de esperar, em um jejum pacífico, que os burgueses viessem apresentar suas desculpas e pedir perdão.
Eis porque eu estimo que a idéia da greve geral fez mal à revolução.
Mas espero e acredito que esta ilusão – fazer capitular a burguesia, tornando-a faminta – desapareceu completamente; e se ela permaneceu, os fascistas se encarregaram de dissipá-la.
A greve geral de protesto, para apoiar reivindicações de ordem econômica e política compatíveis com o regime, pode ser útil se é feita em momento propício, quando o governo e os patrões acham oportuno ceder de uma só vez, por medo do pior. Mas não se deve esquecer que é preciso comer todos os dias e que, se a resistência se prolonga, ainda que por poucos dias, é preciso curvar-se ignominiosamente sob o jugo dos patrões, ou então se insurgir... Mesmo que o governo ou as forças especiais da burguesia não tomem a iniciativa da violência.
Conclui-se daí que se faz uma greve geral, seja para resolver definitivamente o problema, ou com objetivos transitórios, deve-se estar decidido e preparado a resolver a questão pela força.
Retirado do livro : Escritos Revolucionários de Errico Malatesta