terça-feira, 8 de setembro de 2009

MEDO


O amor elimina o medo; mas reciprocamente o medo elimina o amor. E não apenas o amor.
O medo elimina a inteligência, elimina a bondade, elimina todo pensamento de beleza e verdade. Só persiste o desespero mudo ou forçosamente jovial de quem pressente a obscena presença no canto do quarto e sabe que a porta está trancada, e não há janelas. E então a coisa acomete. Ele sente uma mão na sua manga, respira um bafo fétido, quando o ajudante do carrasco se inclina quase que amorosamente para ele. "É a sua vez irmão. Por aqui, tenha a bondade."
E num instante seu terror silencioso é transformado num frenesi tão violento quanto inútil. Não é mais um homem entre seus semelhantes, não é mais um ser racional falando articuladamente a outros seres racionais; apenas um animal ferido, ululando e debatendo-se na armadilha. Pois no fim o medo elimina o homem da própria humanidade. E o medo, meus bons amigos, o medo é a própria base e fundamento da vida moderna. Medo da tão apregoada tecnologia que, enquanto eleva o nosso padrão de vida, aumenta a probabilidade de nossa morte violenta. Medo da ciência que arrebata com uma das mãos ainda mais do que tão prodigamente distribui com a outra. Medo das instituições manifestamente fatais pelas quais, em nossa lealdade suicida, estamos prontos a matar ou morrer. Medo dos Grandes Homens que elevamos, por aclamação popular, a um poder que eles usam, inevitavelmente, para nos massacrar e escravizar. Medo da guerra que nós não
queremos e todavia tudo fazemos para desencadear.

Aldous Huxley - O Macaco e a Essência

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